Monday, April 20, 2015

70 vezes Chico Buarque




70 anos de Chico








Para sempre é sempre por um triz.
Chico Buarque






70 vezes Chico Buarque


por Matheus Pichonelli — publicado 19/06/2014 17h25, última modificação 20/06/2014 10h18


Uma seleção com alguns dos mais belos versos do aniversariante do dia. Por Matheus Pichonelli


Tem o Chico político. O Chico romântico. O Chico cronista. O Chico trovador. E uma multidão de Chicos e Beatrizes e Bárbarbas e Genis e tantos personagens sem nome que não cabem nas caixas de CDs em homenagem a um dos maiores, se não o maior, nomes da música popular em todos os tempos – aquele que, segundo Caetano Veloso, artista do mesmo quilate, nos fezverhttp://cdncache-a.akamaihd.net/items/it/img/arrow-10x10.png “melhor e com mais calma o quanto já tínhamos Noel, Haroldo Barbosa, Caymmi, Wilson Batista, Ary, Sinhô, Herivelto”. Cada um tem o Chico que merece, e o verso favorito para costurar entradas e saídas para a fossa, o riso, o suspiro. (Nas palavras de Maria Bethânia, ele produz emoções só em pensar).


Ao longo do dia, o dia em que Chico Buarque completa 70 anos, passei horas removendo gavetas de memórias afetivas para montar uma lista dos meus dez Chicos favoritos – parei nos primeiros quinze, e desisti. Tantas palavras de domínio tão exato alçaram Chico Buarque a um posto que só nomes como Machado de Assis, Graciliano, Rosa, Clarice, Drummond, Caetano e alguns outros poucos conseguiram alcançar. De tal forma que é inevitável dizer: seríamos mais brutos, mais crus e mais desonestos com tudo o que dá dentro da gente e não devia se estes versos não existissem. A eles:


“Como, se na desordem do armário embutido meu paletó enlaça o teu vestido e o meu sapato ainda pisa no teu”.


Não houve até hoje romancista, pintor, escultor ou cineasta brasileiro que tenha conseguido criar uma imagem lírica tão poderosa quanto a despedida inconformada de “Eutehttp://cdncache-a.akamaihd.net/items/it/img/arrow-10x10.png Amo”: O verso compete apenas com outro trecho da mesma música: “se na bagunça do teu coração, meu sangue errou de veia e se perdeu."


“Morreu na contramão atrapalhando o tráfego”


O fim trágico do operário de “Construção” é o fim trágico de todos nós, os que saem de casa com um mundo às costas sem sequer imaginar que este mundo pode estar em sua última volta – uma última volta transponível para as outras voltas indiferentes de quem vê o outro, e as outras vidas, como um estorvo, ou um saco flácido a atrapalhar o trânsito, o público e o sábado.


“A gente estancou de repente ou foi o mundo então que cresceu?”


O resumo elegante do estado de espírito de tempos autoritários, quando a desesperança anula, aniquila, encolhe e esmaga quem investe contra a “Roda Viva”. É uma dúvida perene: o que fizemos com o que fizeram de nós? Estancamos?


“Não se afobe, não, que nada é pra já. Amores serão sempre amáveis”


A letra de “Futuros Amantes” corre em dois sentidos. É o ansiolítico aos que, na ânsia de viver, esquecem de respirar, e a marola de quem recolhe as certezas e lança ao mar as esperanças em troca de tempo. Usada diariamente por maiores de 10 e menores de 100 anos.


“E tantas águas rolaram, quantos homens me amaram bem mais e melhor que você”


A melodia calma e serena de “Olhos nos olhos” é o tiro de calibre 22 na presunção masculina: penetra sem alarde, mas estilhaça todos os órgãos internos, inclusive o orgulho, sem lágrimas nem pena.


“E que me aperta o peito e me faz confessar. O que não tem mais jeito de dissimular. E que nem é direito ninguém recusar. E que me faz mendigo, me faz implorar. O que não tem medida, nem nunca terá. O que não tem remédio, nem nunca terá. O que não tem receita”

Trecho de “O que Será (À Flor da Pele)”. Porque nem todo sentimento é puro, nem toda adoração é plena, nem toda reação do corpo tem nome.


Toda noite ela diz pra eu não me afastar. Meia-noite ela jura eterno amor. E me aperta pra eu quase sufocar. E me morde com a boca de pavor”.


Nem o “Cotidiano” mais comum é imune ao sublime, ainda que tentemos dirimir todas as dúvidas e ansiedades entre hortelãs e feijões. O beijo final é o único beijo possível: se o beijo não tem pavor não é beijo; é ensaio.


“A saudade dói latejada. É assim como uma fisgada no membro que já perdi”.


Antes de Chico Buarque a saudade, palavra exclusiva da Língua Portuguesa, possuía um significado quase insosso: era a presença de uma ausência. Com “Pedaço de mim” virou uma dor, mas uma dor no lugar certo: um membro que se perdeu. A imagem do revés de um parto não poderia ser mais exata da presença dessa ausência.


“Cada paralelepípedo da velha cidade essa noite vai se arrepiar”.


Já tentou usar a palavra “paralelepípedo” em alguma ocasião? Nem tente: paralelepípedos não são para iniciantes. Trecho inesquecível de “Vai passar”, o hino da pá de cal sobre a página mais infeliz da nossa história.

“Você não gosta de mim, mas sua filha gosta”.


“Jorge Maravilha”, conta a lenda, era endereçada ao general Geisel, cuja filha era fã de suas músicas. Um petardo em forma de sarcasmo e um recado: o novo sempre vence.


“A dor da gente não sai no jornal”

Um hino contra a frieza da “Notícia de Jornal”, incapaz de abarcar a grandeza das pequenas tragédias humanas.


“Hoje eu vou sambar na pista, você vai de galeria. Quero que você me assista na mais fina companhia. Se você sentir saudade, por favor, não dê na vista: bate palma com vontade, faz de conta que é turista”


Hino de qualquer Carnaval, “Quem te viu quem te vê” é um acerto de contas de quem ficou, uma espécie de eu-lírico de “Olhos nos Olhos” às avessas: o conflito entre a essência e a afetação é escancarado por quem brincava de princesa, acostumou na fantasia e já não se reconhece ao ver a sua origem, o morro, desfilar à sua frente.

“Seus dois olhos vão se encontrar no infinito”


Em “Tanto Amar”, um ode ao absurdo: o infinito é algum ponto entre um olho a fitar e outro a boiar. É preciso visão para encontrar beleza entre um olho e outro, algo só possível a quem ama e, de tanto amar, faz com que ela, e ele, acreditem no próprio amor. A moça feia podia se debruçar na janela sem medo de errar: dessa vez a banda tocava pra ela.


“Lá faz primavera pá. Cá estou doente. Manda urgentemente algum cheirinho de alecrim”.


Versão original de “Tanto Mar”. No ano em que a ditadura portuguesa desmoronou, a brasileira vivia seu auge. Levaria mais dez anos para se desfazer, até que se desfez. Do outro lado do Atlântico, a Revolução dos Cravos era uma esperança – doce e efêmera, como o cheiro do alecrim.


“Nós aprendemos palavras duras, como dizer ‘perdi’”
Porque, entre “Tantas Palavras”, final feliz é para os fracos."







Amado por nove entre dez mulheres no Brasil, Chico Buarque completa 70 anos

Cantor celebrou em Paris, segundo amigos, terminando seu próximo romance, previsto para sair em setembro

“Chico Buarque é um dos grandes compositores deste mundo. Um dos meu preferidos, sem sombra de dúvidas. Suas composições são de uma beleza rara. Seu charme é incomparável”, derrete-se Gal Costa, para muitos a maior cantora do Brasil. Ela é uma das famosas que deram os depoimentos sobre o artista no final desta matéria. "Adoro cantar suas músicas. Viva Chico! Parabéns e muitos anos de vida e inspiração".







Ana Carolina, cantora


O Chico é um dos maiores letristas do mundo , suas canções são incríveis, desde aquelas que assobiamos, como ‘A Banda’, até as mais recentes, como ‘Querido Diário’, ‘Porque Era Ela, Porque Era Eu’, ‘Cecília’ e ‘Iracema Voou’. Todas são sensacionais! Salve Chico!












































Tainá Müller, atriz

Chico tem aquela aura de mistério dos homens de poucas palavras faladas e muitos versos escritos a lápis. Não conheço pessoalmente, porém entendo a admiração que atravessa décadas. A beleza dos olhos azuis somada à sensibilidade que aflora de um sofisticadíssimo intelecto fazem de Chico um muso à altura das batalhadoras desse país.

Gaby Amarantos, cantora

Ele tem um que de cafajeste inocente, sabe? Ele consegue ser macho e ter uma extrema sensibilidade em relação à alma feminina, os homens de todas as gerações têm muito a aprender com ele.




Fernanda Young, escritora

Sou fã. Aprendi a escrever, em boa parte, por causa de suas músicas. As mulheres são retratadas em sua dor, beleza, força. Ele canta em primeira pessoa algo que é secreto, íntimo, frágil, na mulher. Como se soubesse de tudo. E sabe. Por isso as mulheres o amam. Em sua poesia, Chico Buarque demonstra entender a mulher. E isso é algo que todas querem. Afora ser um homem belo e tímido. O que também instiga o desejo feminino.

Thalita Rebouças, escritora


Sou muito fã, desde os 14 anos de idade. Dizer que ele consegue traduzir em versos a alma feminina é tão clichê, mas tão verdade… E não é só o lado romântico das mulheres, como prova ‘Meu Guri’, uma pérola. Sou completamente apaixonada e me acabo de chorar ouvindo as músicas. E ele ainda faz músicas para crianças tão geniais quanto as para adultos!!! Posso falar hooooras sobre a obra dele. Percebeu, né?


Érika Martins, cantora

O que bate para mim são as letras, ele escreve de uma forma realmente feminina. A ótica é feminina, as questões são totalmente do nosso universo. Não conheço nenhum outro compositor brasileiro que consiga se transmutar tão intensamente para o nosso lado. E é tão ‘mulherzinha’ que acho até minucioso, como só uma garota saberia fazer. Tudo é detalhado, mesmo o que poderia ser dito rapidamente leva um tempo, detalhe e sensação por sensação.


Paula Lima, cantora

Chico nos encanta por entender a alma feminina, muitas vezes mais que nós mesmas… É profundo, verdadeiro, detalhista… Poético, sonoro e um homem, um compositor, um gênio apaixonante…! Chico, I love you! Obrigada e parabéns!







''Enquanto Chico não tiver rugas na alma, ele estará bem''.

Sunday, April 19, 2015

NARA

NARA

O talento discreto e silencioso de Nara



  • “Sou a mulher mais corajosa que conheço. Na intimidade, podem me chamar de Nara Coração de Leão.”
    Nara Leão



A estreia profissional se deu quando da participação, ao lado de Vinícius de Moraes e Carlos Lyra, na comédia Pobre Menina Rica (1963). O título de musa da Bossa Nova foi a ela creditado pelo cronista Sérgio Porto. Mas a consagração efetiva ocorre após o golpe militar de 1964, com a apresentação do espetáculo Opinião, ao lado de João do Vale e Zé Keti, um espetáculo de crítica social à dura repressão imposta pelo regime militarMaria Bethânia, por sua vez, a substituiria no ano seguinte, interpretando Carcará, pois Nara precisara se afastar por estar afônica. Nota-se que Nara Leão vai mudando suas preferências musicais ao longo dos anos 1960. De musa da Bossa Nova, passa a ser cantora de protesto e simpatizante das atividades dos Centros Populares de Cultura da UNE. Embora os CPCs já tivessem sido extintos pela ditadura, em 1964, o espetáculo Opinião tem forte influência do espírito cetiscista.



Em 1966, interpretou a canção A Banda, de Chico Buarque no Festival de Música Popular Brasileira (TV Record), que ganhou o festival e 
público brasileiro.







E entre as suas interpretações mais conhecidas, destacam-se O barquinho, A Banda e Com Açúcar e com Afeto -- feita a seu pedido por Chico Buarque, cantor e compositor a quem homenagearia nesse disco homônimo, lançado em 1980.

A BANDA 

Contou com a adesão imediata de companheiros do tempo da bossa nova: Tom Jobim, João Donato, Roberto Menescal, Carlos Lyra. Edu Lobo lembrou com a anfitriã os tempos em que ambos eram cantores de protesto, e Chico Buarque trouxe nada menos que a hoje clássica João e Maria. Enfeitou o disco com as flautas de J.T. Meirelles, sumidade do samba-jazz e arranjador do disco de estreia de Jorge Ben.









"Sempre cantei o que me interessa. Menos na televisão. A televisão engole a gente; se a gente não toma cuidado, passa de cantora a vedete."



“Podem me prender/ Podem me bater/ Podem até deixar-me sem

comer/ Que eu não mudo de opinião/ Daqui do morro eu não saio, 

não.”




De mal com a bossa, Nara se convertera em antiexemplo daquilo que a leveza ensolarada de Tom e João preconizava. Tinha virado uma cantora de protesto, uma folk singer nos moldes da norte-americana Joan Baez, preocupada com as dores do povo, a seca e a fome no Nordeste, a pobreza nos morros cariocas. Ao longo de sete LPs individuais preparados em quatro anos, liderou a corrente nacional-participante da música nacional – a recém-batizada MPB. Nessa fase, gravou uma galeria formidável de compositores, que causaria timidez no elenco colorido de Meus Amigos São um Barato.




Do húmus do samba carioca, resgatou autores que andavam recolhidos ao quase-anonimato: Cartola, Nelson Cavaquinho, Guilherme de Brito, Padeirinho (autor da plangente "Favela", quando as favelas estavam longe de ser a enormidade que são hoje), Monsueto Menezes, Zé Keti, Elton Medeiros.

Do sertão maranhense, trouxe a música do zangadíssimo João do Vale, coautor de Carcará e Sina de Caboclo. 

Com todos os olhos e ouvidos abertos para o novo, ao mesmo tempo fez-se pioneira em gravar compositores jovens e pouco conhecidos: Chico Buarque, Edu Lobo, Paulinho da Viola, Gilberto Gil, Torquato Neto, Capinan, Sidney Miller, Sueli Costa, Dori Caymmi, Jards Macalé, Francis Hime.


Nos quatro discos lançados em 1967 e 1969, parecia esboçar uma guinada de volta à velha tradição musical brasileira, gravando João de Barro, Ary Barroso, Lamartine Babo, Custódio Mesquita, Assis Valente, Dorival Caymmi. Era alarme falso: a ex-bossa novista que virara sambista de protesto estava prestes a se filiar às hostes da revolução comportamental chamada tropicália.




Rebeldia em negativo





O ímpeto da primeira década não voltaria a se repetir, mas ao longo dos anos 1970 ela se tornou uma revolucionária musical ao avesso, eloquente mais pela negação que pela afirmação. Abandonou a gravação de álbuns nos primeiros anos da nova década, e em 1972 foi atriz no filme Quando o Carnaval Chegar, contracenando com Chico Buarque e Maria Bethânia. 








                                    JOÃO E MARIA








Quando fez a letra de "João e Maria", o próprio Chico não entendeu o que ele tinha querido dizer com o verso "e o meu cavalo só falava inglês". Ele levou o enigma a Francis Hime, que arriscou: "Eu acho que é um cavalo muito educado."


"João e Maria" foi gravada pela cantora Nara Leão, lançada no álbum Os Meus Amigos São Um Barato, de 1977, que contou com a participação de Chico e Sivuca - o primeiro no dueto, o segundo tocando sanfona.


A canção acabou popularizada pela telenovela "Dancin' Days", da Rede Globo. No auge do sucesso de "João e Maria", que muita gente pensava ser apenas de Chico, Sivuca aproveitou uma série de shows que realizava no Rio para corrigir o equívoco: "a letra era do Chico, mas a música era dele há muito tempo".





                       COM AÇÚCAR COM AFETO


A música “Com Açúcar com Afeto”, um grande sucesso de Chico Buarque na voz de Nara Leão foi feita sob encomenda da própria cantora.Quem contou a história foi o compositor, em uma entrevista publicada no site http://www.chicobuarque.com.br/.


Ele confidenciou que a Nara lhe deu o tema com detalhes. “[...] Ela pediu: "Eu quero uma canção que fala que a mulher sofre, a mulher espera o marido etc. e tal. Eu fiz pra Nara e pro tema exato que ela pediu. Uma canção sob encomenda mesmo”.



Bendita encomenda. O pedido de Nara Leão proporcionou mais um grande clássico da MPB. O belo lamento, imaginado por Chico para atender sua amiga.

Com Açúcar, Com Afeto

Chico Buarque























Com Açúcar, Com Afeto

Chico Buarque



"Com açúcar, com afeto, fiz seu doce predileto
Pra você parar em casa, qual o quê!
Com seu terno mais bonito, você sai, não acredito
Quando diz que não se atrasa
Você diz que é um operário, vai em busca do salário
Pra poder me sustentar, qual o quê!
No caminho da oficina, há um bar em cada esquina
Pra você comemorar, sei lá o quê!
Sei que alguém vai sentar junto, você vai puxar assunto
Discutindo futebol
E ficar olhando as saias de quem vive pelas praias
Coloridas pelo sol
Vem a noite e mais um copo, sei que alegre ma non troppo
Você vai querer cantar
Na caixinha um novo amigo vai bater um samba antigo
Pra você rememorar
Quando a noite enfim lhe cansa, você vem feito criança
Pra chorar o meu perdão, qual o quê!
Diz pra eu não ficar sentida, diz que vai mudar de vida
Pra agradar meu coração
E ao lhe ver assim cansado, maltrapilho e maltratado
Ainda quis me aborrecer? Qual o quê!
Logo vou esquentar seu prato, dou um beijo em seu retrato
E abro os meus braços pra você."









[Em 1989 Nara fez sua última apresentação no Pará. Ao voltar para o Rio, sua saúde piorou e precisou ficar internada por meses, quando seu tumor cerebral rompeu, ocasionando uma hemorragia. A cantora faleceu na Casa de Saúde São José, no dia 7 de junho.]









"Nós aprendemos, Palavras duras, Como dizer perdi, perdi, Palavras Tontas, Essas palavras, Quem falou não está mais aqui

- Chico Buarque"

























("IN Último Segundo"
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